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Ataxina-3 e a disputa entre a reciclagem mitocondrial e a morte celular

Escrito por Kaitlyn Neuman
Editado por Dra. Chandana Kondapalli
Traduzido para o português por Priscila Pereira Sena

Induzir a morte celular ou degradar mitocôndrias adoecidas – essa é a questão: um novo papel da ataxina-3 como mediadora dessa decisão.

Você já ouviu alguém dizer: “Eu posso parecer não estar fazendo nada, mas a nível molecular eu estou bem ocupada”? Provavelmente não. Mas é bastante precisa. Eu espero que, após a leitura desse resumo, você tenha um maior entendimento e empatia por essa declaração.

Todas as tarefas que fazemos, desde uma decisão consciente de ir correr ou nadar, até os processos involuntários de manutenção dos batimentos cardíacos ou digestão do almoço, requerem uma certa quantidade de energia. Você pode pensar nisso como uma reserva de valor. Atividades do tipo correr ou nadar vão custar mais caro do que jogar vídeo game ou tirar um cochilo.

Mitocôndrias são as maiores produtoras dessa reserva de valor energético, a que chamamos de ATP ou trifosfato de adenosina.

A nível de superfície

Quando suas mitocôndrias não estão trabalhando bem, as células “passam fome”, porque não há energia suficiente. As mitocôndrias adoecidas sinalizam à célula para o início da morte celular. Disfunção mitocondrial é a causa de sintomas comuns a muitas doenças neurodegenerativas, como as ataxias espinocerebelares (SCAs). Recentemente a SCA do tipo 3 (SCA3) foi relacionada a defeitos metabólicos e a um comprometimento da mitofagia.

Mitofagia é o nome que se dá ao processo de remover mitocôndrias danificadas para adaptação a condições de estresse. A remoção dessas mitocôndrias, antes delas estarem tão danificadas a ponto de iniciar a morte celular, é protetora ao cérebro e ao corpo. Infelizmente, em algumas situações disfuncionais, a mitofagia é bloqueada ou encerrada, o que leva a uma morte celular descontrolada. Nossos cérebro e músculos são áreas com grande quantidade de mitocôndrias e, portanto, podem se tornar muito vulneráveis, o que leva à neurodegeneração e fraqueza muscular nessas circunstâncias.

Como o número e a localização de mitocôndrias danificadas varia de pessoa para pessoa, os sintomas mitocondriais em SCA3 e outras doenças neurodegenerativas são diversos. Essa variabilidade é, na verdade, algo bom, porque significa que há um caminho possível para modificação da progressão da doença: compreendendo e alterando essas diferenças mitocondriais.

A nível molecular

Ataxina-3, a proteína mutante em SCA3, regula a atividade de parkin, uma proteína crítica no controle de qualidade mitocondrial e relacionada à doença de Parkinson. Durante esse processo, proteínas são marcadas em um processo chamado ubiquitinação, com o objetivo de serem degradadas. Em SCA3, parkin adiciona essa pequena marcação, chamada ubiquitina, a uma proteína de membrana defeituosa, como VDAC1 (mais detalhes a seguir). Essa marcação inicia a mitofagia, através do recrutamento de moléculas que enviam a mitocôndria para reciclagem. Essa atividade é conhecida como mitofagia dependente de parkin.

No entanto, em algumas situações parkin não consegue adicionar essa marcação de ubiquitina a proteínas defeituosas. Em vez disso, parkin marca a si propria para ser degradada, em um processo chamado auto-ubiquitinação. Quando isso acontece, as proteínas que são necessárias para a mitofagia não são recrutadas e, como consequência, inicia-se a morte celular.

Estudos anteriores demonstraram que a proteína ataxina-3 influencia o nível de ubiquitinação de parkin e a mitofagia é inibida em SCA3. Isso provavelmente explica a sobreposição de sintomas em SCA3 e a doença de Parkinson, porque em ambas ocorre a morte celular em áreas que contêm muitas mitocôndrias, como o cérebro e os músculos.

O que os pesquisadores descobriram e como?

Lembra da proteína VDAC1 (canal aniônico dependente de voltagem 1) que eu mencionei ser marcada por parkin para ser degradada? Então, ela exerce um papel importante, determinando quais íons podem entrar e sair da mitocôndria.

Quando as mitocôndrias estão saudáveis, elas estão em um estado polarizado, o que significa que o conteúdo interno está carregado negativamente, em comparação ao ambiente externo carregado positivamente. Essa diferença de carga é o que permite VDAC1 a realizar seu papel de forma efetiva na movimentação dos íons. Por outro lado, quando as mitocôndrias estão doentes ou danificadas, elas se tornam despolarizadas, com um conteúdo interno carregado positivamente.

Cientistas induziram essa despolarização em células saudáveis para entender o que acontece em uma pessoa comum. Eles descobriram que a mitocôndria danificada recruta parkin para marcar VDAC1 e a própria mitocôndria para a mitofagia mediada por parkin.

Para acessar de forma precisa o que acontece em um paciente de SCA3, foram obtidas amostras de pele de pessoas com mutação no gene que causa SCA3. Os pesquisadores confirmaram as observações em células de pacientes com SCA3 através do uso de modelos de camundongo que também contêm a mutação que causa SCA3. Os resultados obtidos nos dois modelos foram similares, então serão resumidos com a utilização de “células de SCA3” como um termo geral para os dois modelos.

Os pesquisadores descobriram em células de SCA3 que, diferente do que ocorre em modelos saudáveis, parkin não era recrutado para mitocôndrias despolarizadas. Em vez disso, eles observaram que a proteína mutante ataxina-3 estava removendo as marcações de ubiquitina da proteína VDAC1, em um processo chamado deubiquitinação. Isso significa que as mitocôndrias danificadas não estavam sendo destruídas e VDAC1 estava permitindo a entrada de grande quantidade de soluto, como água e sal. Esse aumento de líquido na mitocôndria faz com que ela inche e exploda, o que leva à morte celular e neurodegeneração.

Para confirmar essa teoria de retenção de água pela mitocôndria, os pesquisadores analisaram o formato e o tamanho das mitocôndrias. Eles descobriram que os pacientes com SCA3 têm mais mitocôndrias fragmentadas e circulares em comparação com indivíduos sem SCA3. Os pesquisadores também descobriram uma menor produção de energia e células menos saudáveis em pacientes com SCA3.

Esses métodos confirmatórios mostram que as mitocôndrias em SCA3 estavam doentes e em processo de destruição, a mitofagia não foi responsiva em condições de estresse, e a morte celular foi iniciada. Esses achados sugerem que as células de SCA3 encontram uma maneira de contornar o uso de parkin para eliminar as mitocôndrias danificadas.

Pensamentos finais

Em geral, a ataxina-3 é um regulador importante da função mitocondrial, por causa do seu papel na mitofagia mediada por parkin-VDAC1. Esse artigo científico traz a ataxina‑3 mutante como a causa da mitofagia defeituosa em SCA3, e pode ajudar a explicar a disfunção mitocondrial observada nessa doença.

A desregulação mitocondrial é a raiz de muitos sintomas comuns à diversas doenças neurodegenerativas. Por exemplo, problemas similares já foram relacionados às SCAs dos tipos 1, 2 e 7. Alguns dos primeiros sintomas dessas doenças são a perda de peso (ou dificuldade em manter o peso), fraqueza muscular, e letargia, porque muitos processos biológicos críticos estão prejudicados devido à alta demanda energética.

O fato é que mais pesquisas são necessárias para se entender como as vias de mitofagia independentes de parkin afetam a patologia da doença de SCA3, o que pode levar a futuras descobertas de alto valor terapêutico.

Palavras-chave

Mitocôndria: A maior produtora de energia na célula

Mitofagia: Processo pelo qual mitocôndrias danificadas são recicladas para adaptação a condições de estresse e prevenção da morte celular.

Ubiquitinação: Processo no qual uma proteína é marcada com ubiquitina para ser degradada.

Auto-Ubiquitinação: Processo pelo qual uma proteína pode marcar a si própria para degradação através da adição de ubiquitinas à sua superfície.

Deubiquitinação: Processo no qual marcações de ubiquitina são removidos de outra proteína antes que ela seja degradada.

Despolarização: Quando o conteúdo da mitocôndria muda de carga negativa para carga positiva.

Declaração de conflito de interesse

O autor e o editor declaram não haver conflito de interesse.

Citação do artigo revisado

Harmuth, T., et alMitochondrial Dysfunction in Spinocerebellar Ataxia Type 3 Is Linked to VDAC1 Deubiquitination. International Journal of Molecular Sciences, 2022. 23(5933): p. 1-20. (https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC9180688/pdf/ijms-23-05933.pdf)

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