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Dieta rica em Creatina atrasa a SCA3 em camundongos

Escrito por Dr. Lauren R. Moore Editado por Dr.Larissa Nitschke. Inicialmente publicado em 5 de julho de 2019. Traduzido para o português por Ana Carolina Martins.

A creatina, um suplemento alimentar comum tomado por atletas, atrasa sintomas e melhora o equilíbrio e força em camundongos com SCA3.

Poderia um suplemento comum nutricional usado por atletas para aumentar a sua performance também oferecer benefícios para pacientes com ataxia? Essa foi a principal questão abordada por um estudo recente de Ataxia Espinocerebelar do tipo 3 (SCA3), a ataxia de herança dominante mais comum no mundo. O estudo, publicado em Março de 2018, foi liderado pela Dra. Sara Duarte-Silva da Universidade de Minho em Portugal. Dra. Duarte-Silva e seu grupo investigaram se alimentar camundongos SCA3 com um dieta rica em creatina – um suplemento dietético comum – melhora os sintomas e alterações cerebrais associadas com a SCA3. Os pesquisadores descobriram que uma dieta rica em creatina atrasou a doença e retardou o agravamento dos sintomas em camundongos SCA3. Esse estudo fornece evidências promissoras que o aumento ou a adição do consumo diário de creatina pode ter um benefício protetivo para pacientes portadores de SCA3.

A SCA3 é uma das seis ataxias hereditárias causada por um tipo único de mutação genética conhecido como expansão da repetição trinucleotídica CAG. Isso ocorre quando uma sequência repetitiva de três nucleotídeos de DNA – Citosina-Adenina-Guanina ou “CAG” para abreviar – é expandida, criando um número anormal e alto de repetições. Em SCA3, a mutação ocorre em um gene que codifica a proteína ATXN3 e produz uma região anormal mais longa na proteína da doença. Essa região alterada, chamada de expansão de poliglutamina, prejudica as funções normais da ATXN3 e faz com que ela se acumule nas células cerebrais como aglomerados tóxicos de proteínas. Como resultado, a habilidade do cérebro de produzir e armazenar energia é frequentemente prejudicado em pacientes SCA3 (um déficit que também é visto em muitas outras distúrbios cerebrais). Portanto, fármacos ou compostos que melhorem a produção geral e uso de energia em células cerebrais podem ser benéficos para SCA3 e outras ataxias.

Foto por rawpixel.com em Pexels.com

Um desses composto que pode aumentar a eficiência de energia – particularmente no cérebro e músculos – é a cretina. A creatina é produzida naturalmente pelo corpo mas também pode ser consumida através de alimentos como carne vermelha e frutos do mar. Além disso, a creatina é um ingrediente comum em muitos suplementos alimentares disponíveis comercialmente que afirmam melhorar o desempenho atlético aumentando a energia e a reconstrução muscular. Recentemente, a creatina tem mostrado alguns benefícios em modelos de camundongos de outras doenças cerebrais similares a SCA3. Entretanto, se a creatina poderia beneficiar pacientes com SCA3 não havia sido investigado antes deste estudo.

Para avaliar se o aumento do consumo da creatina poderia ser útil para SCA3, pesquisadores realizaram um estudo utilizando um modelo de camundongo com SCA3. O cérebro desses camundongos produz a proteína mutante que causa SCA3, o que faz com que eles apresentem muitos dos mesmos sintomas que ocorrem em pacientes com ataxia: fraqueza muscular, falta de equilíbrio e tremores que começam a aparecer próximo a “fase adulta” na vida do camundongo. Camundongos com SCA3 receberam comida normal ou comida suplementada com um adicional de 2% de creatina a partir da 5ª semana de idade, continuando até a 34ª semana.  Ao longo do estudo, os camundongos foram submetidos a uma série de testes motores com obstáculos para determinar se o alimento enriquecido com creatina teve impacto positivo nos sintomas relacionados à ataxia.

Os pesquisadores observaram uma melhora geral na força muscular, equilíbrio e coordenação no final do teste, apontando potenciais benefícios tanto para o cérebro quanto para os músculos dos camundongos com SCA3. Ao medir a força que os camundongos conseguiam segurar um fio a cada duas semanas, os pesquisadores descobriram que os camundongos que receberam uma alimentação rica em creatina eram mais fortes comparados com os camundongos que receberam uma alimentação normal. Além disso, a dieta rica em creatina atrasou o aparecimento de fraqueza muscular nos camundongos com SCA3. Com a dieta normal, a idade de início da fraqueza em camundongos com SCA3 ocorria na 12ª semana; no entanto, com uma dieta rica em creatina, a fraqueza muscular apareceu na 20ª semana. Em relação a vida útil de camundongos, esse retardo de 8 semanas é bastante considerável. A dieta rica em creatina também levou a algumas melhorias em dois testes físicos baseados em traves de equilíbrio e aumentou muito a velocidade de natação dos camundongos SCA3, uma medida de força e coordenação. No final do teste, os camundongos SCA3 tratados com creatina estavam nadando tão rapidamente quanto os camundongos não SCA3.

Em seguida, os pesquisadores avaliaram se os benefícios sintomáticos da creatina coincidiam com melhorias nas regiões do cérebro que são conhecidas por serem afetadas na SCA3 (muitas das quais estão envolvidas no controle e equilíbrio dos movimentos finos). Como esperado, os camundongos com SCA3 que receberam comida normal mostraram um número reduzido de células de Purkinje, um tipo de neurônio no cerebelo que é criticamente importante para o equilíbrio. Os camundongos SCA3 tratados com creatina, por outro lado, não experimentaram essa perda de células Purkinje – de fato, no final do estudo, o número de células Purkinje em camundongos SCA3 tratados com creatina era indistinguível do número de células Purkinje em camundongos não-portadores de SCA3. Assim, a creatina preveniu com sucesso qualquer morte celular observável. O alimento enriquecido com creatina também evitou sinais de inflamação prejudicial que ocorrem nos cérebros de pacientes SCA3 e camundongos SCA3. Além disso, parecia haver quantidades reduzidas da proteína da doença mutante nos cérebros de camundongos SCA3 tratados com creatina, o que poderia apontar para melhorias na capacidade do cérebro de evitar o acúmulo de proteínas tóxicas ao longo do tempo.

É importante ressaltar que a creatina foi considerada segura e bem tolerada por todos os camundongos neste estudo. A creatina de venda livre como suplemento oral também é considerada geralmente segura em humanos, com poucos efeitos colaterais potenciais. No entanto, algumas evidências sugerem que a creatina pode contribuir para danos nos rins e, portanto, pessoas com distúrbios renais devem falar com seu médico antes de tomar creatina.

No geral, os camundongos que receberam o alimento suplementado com creatina mostraram um início tardio dos sintomas da doença e uma piora mais lenta dos sintomas ao longo do tempo, sem nenhum efeito colateral negativo detectado. Os resultados deste estudo são semelhantes aos resultados promissores de outro estudo que avaliou uma dieta rica em creatina em um modelo de camundongo da doença de Huntington, um distúrbio que compartilha muitos sintomas e características genéticas com SCA3. Ambos os estudos usaram uma dose de creatina que é aproximadamente igual a três gramas por dia para humanos, que está bem abaixo da quantidade diária normalmente usada por atletas para fins esportivos e de treinamento. É importante ressaltar que as melhorias no desempenho motor e na força após o tratamento com creatina em modelos de duas doenças cerebrais diferentes sustentam que a creatina geralmente pode promover a saúde do cérebro e dos músculos e, portanto, também pode ser benéfica para outras ataxias.

No momento, nenhum ensaio clínico foi realizado para avaliar se a creatina tem efeitos benéficos em pacientes com SCA3, portanto, não está claro se as melhorias observadas neste estudo com camundongos se traduziriam em humanos. Além de responder à pergunta mais básica – os suplementos de creatina beneficiariam os pacientes com SCA3? – são necessários ensaios clínicos em humanos para responder a outras perguntas críticas. Por exemplo: quando os pacientes devem começar a tomar creatina? Ou qual é a dose diária correta de creatina para pacientes com SCA3? Antes que a creatina pudesse se tornar um medicamento aprovado e recomendado por neurologistas para pacientes com SCA3, tudo isso precisaria ser abordado.

Vários ensaios clínicos em humanos avaliando a creatina foram realizados para outros distúrbios cerebrais, incluindo doença de Parkinson, ELA e doença de Huntington. Até agora, os resultados têm sido um pouco conflitantes. Em um ensaio clínico, os suplementos de creatina pareciam reduzir a perda de células cerebrais em pacientes de Huntington, mas não levaram a nenhuma melhora considerável nos sintomas motores ou cognitivos. Assim, a creatina provavelmente teve alguns benefícios, embora modestos, para esses pacientes. Por outro lado, em vários grandes ensaios clínicos, os suplementos de creatina não levaram a melhorias mensuráveis em pacientes com doença de Parkinson ou ELA. Independentemente disso, o perfil de segurança da creatina e as crescentes evidências experimentais que suportam seus potenciais benefícios apontam para a necessidade de estudos futuros de terapias baseadas em creatina para SCA3.

Palavras-Chave

Creatina: Um aminoácido (os blocos de construção molecular das proteínas). A creatina é produzida naturalmente pelos rins, pâncreas e fígado do corpo, embora também seja encontrada em carnes vermelhas e frutos do mar. Nos humanos, a creatina é mais abundante nos músculos e no cérebro, onde é armazenada e posteriormente decomposta em energia. Na alimentação, os suplementos de creatina são normalmente comercializados como uma forma de melhorar o desempenho atlético, aumentando a energia e ajudando a construir massa muscular (embora evidências claras que apoiem esses benefícios à saúde sejam limitadas).

Células de Purkinje: Um tipo de célula cerebral localizada no cerebelo que desempenha papéis importantes na regulação e coordenação do movimento. A disfunção ou perda de células de Purkinje é uma causa comum de sintomas motores em muitos tipos diferentes de ataxia.

Declaração de conflito de interesse

A autora e a editora declaram não haver conflito de interesse. A Dra. Patrícia Maciel, que realizou o trabalho descrito neste artigo, é colaboradora da SCAsource. A Dra. Maciel não teve nenhuma contribuição na redação ou edição do artigo.

Citação do Artigo Revisado

Duarte-Silva, S., et al., Neuroprotective Effects of Creatine in the CMVMJD135 Mouse Model of Spinocerebellar Ataxia Type 3. Mov Disord., 2018. 33(5): p. 815-826. (https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/29570846)

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